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A demolida

- “O dia do fim da Perimetral é hoje.” - Em todos os canais, o atual perfeito Eduardo Paes, anunciava, em comício, que seria demolida naquela tarde.
Dona Lúcia via pela TV, a entrevista do prefeito, juntamente com seus dois filhos, Violeta e Vítor.
Neste dia, eles estavam na casa de seu pai, que havia morrido anos antes, na Praça XV, tomando um café e assistindo a entrevista.
- Será que esse projeto é mesmo necessário? Poxa, a Perimetral constrói uma parte da história do Brasil. - disse Violeta tomando um gole de café.
- Vi no site do Porto Maravilha o resultado esperado para o fim do projeto. Ficou realmente muito legal, gostei. - disse Vítor. Depois desses comentários, a mãe levanta, sai do recinto e vai até seu quarto.
Momentos mais tarde, ela volta com uma espécie de maleta. Era daquelas que possuem tranca com segredo. Veio até eles com o objeto na mão esquerda e com a outra mão no peito direito, no coração, para expressar um carinho por aquilo e disse:
- Violeta, nesta maleta contém todo o dinheiro de nossas economias e uma parte da aposentadoria do pai de vocês. Contém trinta mil reais aqui. Preciso que leve para o banco. Não podemos ficar com esta quantia guardada em casa.
- Ah, quer saber, não tenho nada para fazer mesmo, vou contigo! Até porque, essas ruas de hoje estão muito perigosas para se andar só. – disse Vítor, animado. Foi andando para a porta tomando o último gole de café. Abriram-na e na frente encontrava-se um carro.
- Levem esse dinheiro com muito cuidado. Ah, oi Valter. Tudo bom? – Valter era o amigo policial da família. Ele acabara de sair do portão de sua casa.
- Oi Dona Lúcia, vou bem e a senhora? Oi Violeta. Fala aí Vítor. – disse o homem cumprimentando os garotos e dando um beijo no rosto de Dona Lúcia.
- Vou bem meu filho, vou bem. Valter, você está muito ocupado no momento? – Dona Lúcia dizia.
- Não agora, por quê?
- Preciso que leve meus filhos ao banco. Você é policial, pode protegê-los.
- Ah não sei. Vai demorar? O trânsito deve estar um caos por conta da interdição de várias ruas, afinal a derrubada da Perimetral é hoje. Vocês viram na TV não é?
- Sim, nós vimos. Mas não dá mais para guardar esse dinheiro aqui.
- Mãe, a senhora está atrapalhando o serviço do Senhor Valter. Não será necessário. Muito obrigado. – Vitor não gostou da ideia de Valter ir também. Não se davam bem.
- Ok então. Vamos! – Vitor deu a xícara para a mãe. - Ah, olha que legal aquele carro, quer dizer, o adesivo colado nele.
- Dirija devagar, filha. Vão com Deus. Obrigado, Valter! - Lúcia o ignorou totalmente.
- Pode deixar mãe. Beijo. Vem Vítor – gritou Violeta chamando o irmão que ainda olhava o adesivo.
Violeta dirigia, Valter ia à frente e Vitor atrás.
- Coloquem os cintos. - avisou Valter.
Dona Lúcia ficou parada, olhando-os até virarem a esquina. Quando escuta um barulho a suas costas. Olha para trás rapidamente e vê dois homens encapuzados, ambos com arma em punho indo a sua direção. A senhora vira-se para eles e faz uma cara de espanto.
- O adesivo ficou ótimo. Gostei. - Lúcia olhava para o adesivo, admirada.
- Podemos ir agora, senhora? Eles já devem estar longe o bastante. - disse um dos bandidos.
- Esperem mais um pouco. Prestem atenção seus patifes. Quero que peguem a maleta de volta e traga-a para mim. Quanto aqueles dois inúteis, podem dar um jeito neles. Valter ajudará vocês. Ele os levará para o beco, e aí vocês atacam. Tomem cuidado para não machucarem muito o Valter. Ele já sabe todo o esquema.
- Sim senhora. Pode deixar. - o bandido mais alto falou.
- Senhora, é melhor "nós ir", eles vão está muito longe. - disse o outro.
- Ok. Agora podem ir. - Os homens entraram no carro. Lúcia deu um sorriso. - Até que enfim consegui. O dinheiro daquele velho idiota agora é todo meu. A é tenho que ligar para o Vitor. - Lúcia pega o celular.
- Filho, há dois bandidos armados seguindo vocês. Eles estão num carro preto com um adesivo colado no capô. – Dona Lúcia quase chorava, fingindo.
- É o que mãe? Bandidos?
- O que você disse Vítor? Bandidos, foi isso mesmo que ouvi? – perguntou Violeta, já assustada.
- Espera aí Violeta cala a boca! Repete mãe, devagar.
- Assim que vocês saíram, dois homens apareceram renderam-me e perguntaram quanto tinha na maleta. Em seguida partiram atrás de vocês.
- Obrigado, mãe. – disse Vítor desligando o celular. – Tem dois homens num carro preto com adesivo no capô nos seguindo. Sabia que aquele carro era suspeito. Temos que nos livrar deles!
- Eu sei o que fazer garotos. Entrem na próxima esquina, à direita. - Valter estava fazendo muito bem a sua parte.
- Onde será que eles estão agora?
- Será aquele carro lá atrás? – Violeta olhou para o retrovisor e viu o carro preto, onde se encontrava um adesivo no capô.
- Pisa fundo Violeta. Rápido!
- Não vai ter como correr mais rápido, Vítor. Está tudo parado.
- Fiquem calmos. Vai dar tudo certo. Entre à esquerda.
Valter estava indo bem, mas poderia ir muito melhor. Seu celular, que se encontrava no adaptador de bolso tocou. Os irmãos olharam o celular, Violeta mais rapidamente. Quem ligava era Dona Lúcia. Valter não percebeu que os garotos haviam olhado.
- Fala chefa... Ta tudo indo bem... Sim, já estamos chagando... Que? Não entendi?- os irmãos se olhavam via retrovisor. – Entra naquela rua ali garota, agora! Desliga o celular.
Os garotos não estavam entendendo. O que estava acontecendo com Valter? Por que estava tão grosso de repente? O carro para no sinal quando o celular do policial toca novamente.
- Fala ai cara. To com eles aqui. Vocês estão aonde? Ah! Atrás de nós. Beleza. - e desligou o celular. Lá atrás, na esquina, o caro onde se encontravam os bandidos estava fazendo a curva. Mas logo parou, pois o sinal estava fechado.  – Sim, isso é um assalto. – Numa atitude frustrada, Vitor agarra o pescoço do policial. Violeta não pensou duas vezes e ajudou o irmão. Não estava adiantando e o sinal abriria da li a alguns segundos. O homem se debatia tentando sair do mata leão. Para seu azar, usava o sinto de segurança. Era mais difícil de sair. Sabe um peixe fora d’água, Valter estava idêntico. Batia as pernas enquanto tentava tirar as mãos de Vitor de seu pescoço.
- Soca a barriga dele Violeta, rápido, o sinal vai abrir.
O sinal se esverdeou. No desespero, Violeta pega o cinzeiro da mãe e bate com uma força tremenda na cabeça do homem. Desmaiou.
- Tira o sinto dele, vamos jogá-lo aí na pista. – Violeta destravou o sinto. Os carros atrás buzinavam descontroladamente.
- Vai Violeta dirige! Eles ainda estão atrás de nós!
À medida que os carros iam dando a volta, o carro do adesivo ia chegando mais perto.
- Pisa fundo!
A garota sai em disparada. Ia fazendo ziguezagues tentando passar os outros motoristas. Buzinas ecoavam pela rua.
A entrevista ainda "rolava". Em volta da Perimetral não se encontrava nenhum prédio que não estivesse coberto por um grande plástico transparente para impedir a poeira de entrar nos apartamentos próximos.
Todas as esquinas se encontravam bloqueadas. Porém...
- Vi, entra naquela rua.
- Tá louco! Ali vai dar direto na Perimetral!
- Confia em mim, Violeta. Entra na próxima.
- Você ainda vai nos matar.
Enquanto isso os bandidos iam atrás, na cola.
- Anda mais rápido, Felipe. Vai, vai, vai. – um dos bandidos, George, gritava ao ouvido do parceiro.
O sistema de segurança falhou. Os dois carros, apenas os dois carros, entraram no viaduto.
Os helicópteros sobrevoavam o local, pois estava a poucos minutos da grande demolição.
- Liga o rádio, Vi, por favor.
- “Estamos aqui, neste lindo dia ensolarado, para um feito que mudará todo o perímetro da região portuária: a demolição da Perimetral. As bombas já estão postas e num simples apertar de botão pedras voarão. Vamos começar com a contagem.” – disse Eduardo Paes pelo rádio. – “dez”.
Os irmãos se olharam, mas já era tarde. As bombas começariam a ser explodidas atrás deles.
- “Nove”.
- Corre Violeta, corre.
- “oito, sete, seis, cinco...”
A imagem do rosto de Dona Lúcia vinha na mente dos garotos. Vitor olhava para trás, checando se os bandidos ainda os seguiam. E estavam lá.
- “quatro, três, dois...”
- Desculpa Violeta.
- “um”.
Um dos homens no helicóptero avista os carros e tenta avisar, porém, as explosões já haviam começado. “Boom, boom, boom...”
Atrás, tudo caía. Os carros agora mais rápidos que nunca. Os bandidos não estavam mais interessados pelo dinheiro, queriam sair dali. A poeira se dissipava pelo ar, o barulho infernal dar bombas assustavam ainda mais os irmãos. Do alto, viam-se as explosões atrás e cada vez mais se aproximando dos dois carros. “Boom... Boom... Boom...”
- “Como deixaram isso acontecer?” – dizia Eduardo Paes pelo rádio.
Violeta e Vitor estavam desesperados, porém, concentrados. Pedras voavam em diversas direções, uma, inclusive, bateu no vidro traseiro do carro dos bandidos os deixando assustados.
- “Como entraram? Estava tudo interditado!”- disse um dos comandantes de um dos helicópteros.
- Vitor, a Perimetral é enorme. Será que conseguiremos?
- Tenha calma Vi, vamos conseguir.
Realmente o caminho era longo, e o medo de ser explodidos juntos com o viaduto era maior. Para sorte deles, a Perimetral não foi demolida de uma vez só. Porque se fosse...
Finalmente estavam chegando ao fim do grande viaduto. E as bombas continuavam. “Boom... Boom...”
O carro dos bandidos estava ficando para trás.
- O que será que está acontecendo com eles? Será que acabou a gasolina? Coitados. – comentou Vitor.
- Não sei. Mas espero que eles se apressem, senão, boom.
E foi isso que aconteceu. O carro foi parando, ficando lento a cada instante. BOOM. O carro onde os bandidos estavam se transformou em pedaços pequenos de alumínio preto.
- “Caraca” Violeta, você viu aquilo! Meu Deus!
- Vi Vitor. Estou com medo, muito medo.  
- Estamos chegando, calma.
Por uma coisa não esperavam. Depois de toda aquela corrida, de toda aquela loucura com o policial, a gasolina iria acabar justo naquele momento? 
- Não acredito nisso. Estamos frios!
Para a sorte deles a extensão da Perimetral estava acabando. Faltava muito pouco para eles saírem daquele inferno poeirento e perigoso. Enquanto isso, as bombas iam explodindo. "Bom... Boom... Boom..."
O carro, como o dos pobres bandidos que neste momento estavam pagando por todos os seus pecados, estava devagar, quase parando. As explosões estavam chegando.
- Temos que aguentar firme. Falta pouco.
"Boom... Boom..."
- Vitor não vai dar. Estamos quase sem gasolina.
- Vai dar sim Vi, vai dar.
Os bombardeios não paravam e a cada segundo o carro ia parando.
- Vamos Violeta!
- AAAAAHHHHHHH...!
Uma bomba explode logo atrás deles os lançando para longe. Conseguiram sair da Perimetral, porém, não ilesos. O carro capotou, pois a bomba não explodiu logo abaixo deles, como aconteceu com os bandidos o impacto da mesma que fez o carro rodopiar.
O carro rodou e rodou por um longo espaço. Os irmãos gritavam enquanto o carro era jogado para longe como um brinquedo. Por sorte usavam os cintos de segurança, caso contrário, o estrago seria grande. Por fim a carro parou, de cabeça para baixo. As rodas ainda giravam. Violeta e Vitor encontravam pendurados pelos cintos.
Agora só se ouvia o barulho do helicóptero e pedras que ainda caíam.
- Você está bem Violeta?
- Minha cabeça dói fora isso estou bem. E você? - a voz dela estava cansada. Logo depois abafou uma tosse.
- Estou bem. - disse isso e logo depois se desprendeu do sinto e ajudou sua irmã.
Perto dali, um celular toca. O tom não era estranho.
- É o celular do Valter. Vamos ver quem é.
- É a mamãe! - Vitor ia quase atendendo quando...
- Não espera cair na caixa postal.
Segundos depois uma mensagem de voz.
- " Estrupício, por que não atende esse celular? Já conseguiu pegar minha maleta de volta? E os garotos, deu um jeito neles? Olha, se você sumir com meu dinheiro, seu inútil, eu acabo com sua raça! Me liga o mais rápido que poder. Quero torrar todo o dinheiro daquele velho idiota."
Eles não acreditaram no que haviam acabado de ouvir. Não poderia ser verdade. Só se fosse outra pessoa. Mas não era, Dona Lúcia era uma mal caráter.
- Não pode ser. Mamãe armou essa arapuca para pegar todo o dinheiro do papai? - Vítor não acreditou. Ficou boquiaberto.
- Eu já vinha desconfiando. Ela estava muito estranha ultimamente. Outro dia a vi mexendo em alguma coisa no quarto, não consegui ver o que era exatamente, mas quando entrei, sem bater, ela se assustou e tentou esconder o que fazia. Fui lá mais tarde, porém, não achei o que ela estava escondendo. - sua testa sangrava, havia batido a cabeça no momento do acidente.
- Ontem mesmo ela falava ao telefone, baixinho, como quem conversa as espreitas. Me viu e desligou o telefone na cara de quem estava falando.
Os irmãos se olharam, incrédulos, não queriam acreditar no que estava acontecendo. Não passava pela cabeça dos dois o fato de sua mãe ser uma ladra.
- O que faremos agora? - Vitor gostava da mãe, mas o que ela havia feito mexeu muito com ele.
- Denunciamos.
Não queriam, mas era preciso. Violeta ligou para a polícia e fez a denúncia. Sentiu uma pontada no coração quando desligou o celular, abraçou o irmão e os dois puseram a chorar.
Dona Lúcia foi presa em flagrante. Foi levada para a penitenciaria feminina de São Paulo.
Meses se passaram e os garotos viveram juntos na casa do pai, na Praça XV.



João Paulo Silva de Lima

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